Com o aumento do volume de armazenamento de informações, possibilitadas pelas transformações ocorridas no final do século XX, novas formas de comunicação foram também desenvolvidas. É nesse contexto que as tecnologias, encabeçadas pelo uso do computador, despontam como uma das principais ferramentas de interlocução entre pessoas.
No novo modelo social, ninguém parece duvidar de que vivemos numa sociedade cuja construção foi influenciada pelo desenvolvimento das telecomunicações e da informática. De um modo geral, os nossos comportamentos estão sendo atualizados, em grande parte, pelos instrumentos existentes no domínio da comunicação. Deste modo as novas tecnologias concentram seus esforços no desenvolvimento de técnicas inovadoras de se comunicar.
Nessa perspectiva, a união de grupos de indivíduos, interagindo de maneira síncrona e assíncrona deram origem as chamadas comunidades virtuais. Estes espaços parecem ganhar a preferência dos internautas seja para bater um mero papo informal, ou até mesmo para desenvolver pesquisas de ponta. Mas qual seria o motivo para essa coqueluche?
Uma das respostas seria por causa da velocidade de comunicação e pelo apelo ilustrativo proporcionado pelas mídias envolvidas nesses ambientes. Outra resposta poderia se pautar no fato da praticidade de se comunicar com várias pessoas em diversos lugares, que fizeram, ou fazem, parte de nossas vidas, sem precisar sair de casa. Ou quem sabe pelo simples modismo de se participar de uma comunidade virtual.
Acredito que o grande pretexto para quem participa das comunidades virtuais é o simples fato da possibilidade de atualização de realidades latentes, que encontram materialidade, nem que sejam por pouco tempo. A necessidade de relacionamento social é uma característica intrínseca aos seres humanos e a, otimização ou manipulação dos laços afetivos é um atrativo natural para qualquer membro de nossa raça.
Viver em comunidade não é nenhuma novidade. O encanto está em levar essa vivência às ultimas conseqüências, em ma espaço de possibilidades não-linear, de tal forma que os caminhos e as relações sociais se atualizam a todo o momento. Mudar de identidade passou a ser algo trivial, onde o perfil híbrido e histórico é o que difere cada membro participante.
Nessa perspectiva de opções, as idéias de cooperação e colaboração despontam como eixos de trabalhos, que orientam as redes produtivas sejam para um simples fórum de debates ou até mesmo para a construção de softwares em código aberto.
A existência de redes informais de colaboração no interior das organizações e entre as organizações já é um fenômeno social já estabelecido. Elas coexistem em paralelo as estruturas formais das organizações gerando seus próprios padrões e normas de interação. Estas redes informais tem sido alvo de vários estudos na pesquisa social (HOMANS, 1950. GROSS, 1953. BLAU&SCOTT, 1962. apud KIMIECK,2002).
Wenger, (1998) que define essas redes informais de colaboração como comunidade de prática formadas por pessoas engajadas em um processo de aprendizagem coletiva em um domínio compartilhado, tais como: um grupo de engenheiros trabalhando em problemas similares, um grupo de alunos/professores definindo suas identidades na escola, uma rede de cirurgiões explorando novas técnicas.
Assim, comunidades de prática são grupos de pessoas que compartilham uma preocupação, um objetivo ou uma paixão por alguma ação que fazem e aprendem, através de uma interação constante com os membros dessa comunidade, como fazer essa ação cada vez mais aprimorada. Essa definição propõe, mas não assume, intencionalmente, que a aprendizagem pode ser a razão principal para uma comunidade começar, ou ainda a aprendizagem pode ser o resultado incidental da interação entre os membros da comunidade. Nem tudo o que é chamado de uma comunidade é uma comunidade de prática. Para o autor, três características são cruciais para uma comunidade ser uma comunidade de prática: o domínio, a comunidade e a prática. Essas características são apresentadas pelo autor, da seguinte forma:
O domínio: A comunidade de prática possui uma identidade definida por um domínio compartilhado de interesses, assuntos, temáticas ou conhecimentos. Os membros impõem um comprometimento ao domínio escolhido e, uma competência compartilhada que os distingue de outras pessoas. Os membros de uma comunidade de prática valorizam suas competências coletivas e aprendem uns com os outros, mesmo que poucas pessoas fora do grupo valorizem ou mesmo reconheçam essa especialidade.
A comunidade: Os membros da comunidade se envolvem em atividades conjuntas e discussões, procurando interesses comuns em seus domínios, ajudam uns aos outros, compartilham informações e constroem relacionamentos que propiciam uma aprendizagem compartilhada.
A prática: Uma comunidade de prática não é meramente uma comunidade de interesses. Membros de uma comunidade de prática são praticantes, isto é, desenvolvem um repertório de pesquisas compartilhadas, tais como: experiências, histórias, ferramentas, formas de lidar com problemas recorrentes. Esse processo leva tempo, sustenta e mantém a interação do grupo.
Segundo o autor, em comunidades de práticas, a negociação de significados é um processo complexo que leva tempo, pois o que define a comunidade de prática em uma dimensão temporal é a questão do compromisso e engajamento mútuo, a fim de que todos os membros compartilharem uma aprendizagem compartilhada e significativa.
A partir desta perspectiva, o referido autor afirma que as comunidades de prática podem ser pensadas como histórias de aprendizagem compartilhada. Nesse sentido, “história” não é uma questão meramente pessoal ou uma experiência coletiva, mas uma combinação de participação e reificação, dois modos de existência ao longo do tempo, que interagem mesmo localizados em dimensões diferentes. Para o autor, nossa experiência, nossa prática, está em constante movimento, sempre interagindo com outras práticas e experiências, sem se fundir a elas.
A participação representa a ação de tomar parte em alguma coisa, assim é na relação com outras pessoas, nas comunidades de prática, que esse processo se torna evidente. A participação é tanto pessoal quanto social e é concebida como um processo completo que combina as ações de fazer, falar, pensar, sentir e pertencer.
A reificação, por sua vez, é entendida como a conversão de algo em coisa, esse algo pode ser compreendido como idéia, faculdade, pensamento, etc., ou seja, é uma maneira geral para se referir ao processo de dar forma à experiência, produzindo objetos que moldam essa experiência em uma coisa concreta. Assim, esse termo abraça e amplia uma gama de processos que incluem fazer, desenhar, representar, nomear, codificar, descrever, perceber, interpretar, utilizar, reutilizar, decifrar e reestruturar. Logo, em todos esses casos, esses processos se solidificam em formas concretas de aspectos da experiência e da prática humana e, é isso que lhes dá a condição de objeto.
Com essas perspectivas, estamos conectados à nossas histórias por meio da forma como os artefatos são produzidos, preservados, resistidos ao tempo, reapropriados e modificados através dos anos, e também através de nossa experiência e participação, assim como nossas identidades são formadas, herdadas, rejeitadas, bloqueadas e transformadas pelo engajamento na prática de geração para geração. Wenger (1998) observa que as experiências adquiridas continuamente estão intimamente ligadas às práticas.
Nesse sentido, a aprendizagem não se processa em um contexto no qual simplesmente as pessoas devem aprender alguma coisa, mas sim estarem engajadas na prática. Assim, faz parte da aprendizagem este processo de engajamento, participação e desenvolvimento da prática. Neste contexto,
“[...] práticas são histórias de engajamento, negociação e desenvolvimento de repertórios compartilhados, então, aprendizagem na prática inclui seguir o processo da comunidade envolvida. Mas, é preciso tomar cuidado para não dizer que qualquer coisa que se faça é aprendizagem. A aprendizagem significativa abrange dimensões da prática como: envolvimento e formas mútuas de engajamento; entendimento; desenvolvimento de repertórios compartilhados, estilos e discursos. Isso é o que modifica nossa habilidade de engajamento na prática, de entendimento sobre o porquê fazemos parte dessa prática. Esse tipo de aprendizagem não é meramente um processo mental, mas tem a ver com o desenvolvimento de nossas práticas e de nossa habilidade para a negociação de significados. Assim, criamos maneiras de participação na prática no processo de contribuição para fazer dessa prática o que ela é”. (Wenger, 1998 p.94)
Assim, para o referido autor, prática é o compartilhamento de histórias de aprendizagem que requer uma compreensão para que ocorra engajamento. É um processo social e interativo, no qual as pessoas trocam, fazem coisas juntas, negociam novos significados e aprendem uns com os outros. Sendo assim viver em comunidade passa a ser um processo natural de aprendizagem.
KIMIECK, J. L. Consolidação de Comunidades de Pratica: Um estudo de caso no Proinfo. Curitiba, 2002. Dissertação de Mestrado – Programa de Pós-Graduação em Tecnologia, Centro Federal de Educação Tecnológica, Curitiba, 2002.
WENGER, E. (1998). Communities of practice: Learning, meaning, and identity. New York: Cambridge University Press.