terça-feira, 26 de abril de 2011

Ser ou não ser tecnológico? Eis a questão.

Quem já passou pela situação de ser abordado na fila do caixa eletrônico por uma pessoa idosa ou por alguém com dificuldades de utilizar o artefato bancário para sacar o tão esperado provento mensal? Pois bem, eu já. Particularmente, achei constrangedor, pois não havia um funcionário do banco e tive que fazê-lo. Não que eu quisesse negar ajuda a uma pessoa com dificuldades, mas pelo fato de ter acesso a todos os seus dados bancários. Ela me agradeceu imensamente pela ajuda sem saber do quão perigoso poderia ser aquele gesto.

As vezes me pergunto quais os limites da implantação das tecnologias dentro de certos contextos. Se retomarmos por exemplo a questão dos caixas eletrônicos, encontramos o dilema tecnológico em si mesmo. De um lado temos os bancos oferecendo um serviço individualizado, onde os próprios clientes fazem suas operações através das máquinas de autoatendimento no intuito de “agilizar” sua ida ao banco e não passarem horas nas filas. Por outro lado, nos deparamos com a possibilidade de alguém estar filmando, ou quem sabe informando a outra pessoa fora da agência pelo celular sobre as transações bancárias de alguém que utiliza os caixas eletrônicos. Aliás, tal possibilidade justificou a proibição da utilização dos celulares dentro das agências bancárias, o que aliás é muito bem vigiada. Mas então a quem de fato serviu a implantação da tecnologia do autoatendimento? Para alguns caiu como uma luva, pois perder tempo em fila é algo dispendioso. Para outros, menos instruídos”, ir ao caixa eletrônico passou a ser uma aventura com possibilidades de desfechos trágicos. Para a agência bancária, representou uma grande economia com funcionários, haja vista que uma máquina trabalha mais que oito horas e não sai para almoçar. Outros preferem nem ir ao banco, fazem suas operações, quando possível, pela internet, tomando o cuidado para seus dados não serem clonados. E para aqueles que ainda preferem ir até a fila do caixa “não eletrônico” vão ter que se deparar com o não cumprimento da lei que regulamenta o tempo mínimo na fila do banco.

Penso que a disseminação das tecnologias da informação e comunicação nos vários setores da sociedade não foi acompanhado pelo processo de popularização desses artefatos tecnológicos tanto no que diz respeito ao acesso, como no que tange ao desenvolvimento de uma cultura que consiga mediar as propostas tecnológicas com as demandas sociais.

Paralelo à esse déficit encontramos um conflito de gerações, onde há aqueles que nasceram sem computador, e não fazem questão dele; aqueles que nasceram sem computador no quarto e não vivem mais sem ele; e aqueles que são digitais desde a ultrassonografia e aprendem a manusear o mouse ante de se alfabetizarem. Temos então o seguinte questionamento: como achar uma equação que consiga atender a todas a essas demandas sem perder de vista as pressões sociais por um mundo cada vez mais globalizado?

terça-feira, 12 de abril de 2011

É possível capitalizar o pensamento?

A migração da sociedade do trabalho para uma sociedade em nuvem provocou grandes transformações em nossa forma de pensar. Mudar o eixo de produção dos objetos materiais para os bens imateriais demandou esforços não tão triviais em uma perspectiva onde a gestão da informação gerou em si mesma a descentralização do poder dando espaço à ações colaborativas.

A produção de “algoritmos de pensamento” transcritos em linguagens de programação deu origem a uma era onde a moeda de troca passou a ser a forma de se pensar. Mas será que possível capitalizar o pensamento? Parto do princípio que não. A inteligência é algo que flui num complexo de relações onde as conexões são feitas de maneira hipertextual. Tentar aprisionar essas relações em um software passa a ser uma atitude em vão, já que barrar essas conexões demandaria um arcabouço operacional capaz de dar conta de um conjunto infinito de soluções.

Presenciamos uma cultura onde a disseminação das tendências encontra nas tecnologias da informação e comunicação, um meio bastante veloz de propagação. A idéia do software livre influenciados pela proposta da web 2.0 e futuramente pela web semântica, só nos alerta que será uma questão de tempo para a queda da tentativa de se monopolizar o pensamento. Em substituição a ideologia capitalista, encontramos nas soluções colaborativas opções razoáveis de socialização e compartilhamento de idéias em prol de um coletivo onde não há espaço par sistemas fechados de raciocínio. Viva a colaboração.

terça-feira, 5 de abril de 2011

Capital x Informação

Desde sua existência o homem procurou formas ininterruptas de se relacionar. Para isso, conjuntos de signos e significados foram construídos da perspectiva de se estabelecer um padrão de linguagem na qual as trocas fossem possíveis, permitindo a construção de um legado cultural, fruto das relações e instituições construídas ao longo da história humana.


De lá para cá as sociedades construídas foram se moldando de acordo com as formas de relacionamentos estabelecidos. O período chamado de indiferente, foi marcado por hierarquias bastante definidas e locais, onde o poder estava associado ao latifúndio e à manutenção dos poucos privilegiados, detentores dessa condição. Tudo mais era reflexo de uma sociedade piramidal, onde uma massa era requisitada para servir seus imperadores. A via social era de mão única sem maiores variações.


Com o advento do capital e do desenvolvimento das máquinas a vapor, foi possível reconstruir as estruturas das relações sociais, a tal ponto de uma nova revolução encabeçada pela indústria, conseguir encontrar no trabalho e na mecanização sua principal moeda de troca. Estava instaurada a modernidade. Esse período perdurou, até a descobertas da Física Quântica, onde foi possível o entendimento e a manipulação do quantum de energia. Estava aberto o caminho para a possiblidade de armazenamento, processamento e envio de informações a longas distâncias.


Daí em diante o domínio desses processos deram origem ao surgimento de máquinas construídas especificamente para esse fim. A contemporaneidade foi marcada pelo desenvolvimento e aperfeiçoamento desses artefatos tecnológicos, promovendo mudanças na forma de se relacionar. Eis que surge a pós-modernidade.


Destacamos aqui, as formas de relacionamento promovidas pelas possibilidades desencadeadas pela proliferação da informação. Os vínculos, as vias de comunicação, a interação entre emissor-receptor, as relações espaço tempo, tudo demandou novas formar de pensar e de comunicar.


As primeiras gerações de tecnologias da informação e comunicação (TIC) iniciaram seu processo de implantação, ainda de maneira massiva e inspiradas em um referencial estático, onde o modelo de interação tendia ao formato via unilateral. O importante era disponibilizar grandes volumes de informação em uma plataforma estática e pesada. Ainda não havia espaço para interatividade.


Em uma segunda versão das TIC, um conjunto de protocolos encabeçados pela filosofia da WEB 2.0, deslocou essa a via única de comunicação de maneira a torna-la bilateral, abrindo espaço para relacionamentos em rede e práticas colaborativas, onde o importante não é o volume de informação, mas a magnitude das trocas. Isso permitiu a horizontalidade das ações desprivilegiando uma posição central nas relações.


Nessa perspectiva, a sociedade se encontra em uma região de conflito onde de um lado encontra-se o capital, ainda detentor dos meios de produção, inclusive dos meios comunicacionais; do outro a informação, capaz de destruir e reconstruir relações e significados, antes nunca questionados. A disputa entre capital e informação, constitui-se em um dos maiores debates do século XXI.

sábado, 2 de abril de 2011

Comunidades de Prática x Aprendizagem

Com o aumento do volume de armazenamento de informações, possibilitadas pelas transformações ocorridas no final do século XX, novas formas de comunicação foram também desenvolvidas. É nesse contexto que as tecnologias, encabeçadas pelo uso do computador, despontam como uma das principais ferramentas de interlocução entre pessoas.

No novo modelo social, ninguém parece duvidar de que vivemos numa sociedade cuja construção foi influenciada pelo desenvolvimento das telecomunicações e da informática. De um modo geral, os nossos comportamentos estão sendo atualizados, em grande parte, pelos instrumentos existentes no domínio da comunicação. Deste modo as novas tecnologias concentram seus esforços no desenvolvimento de técnicas inovadoras de se comunicar.

Nessa perspectiva, a união de grupos de indivíduos, interagindo de maneira síncrona e assíncrona deram origem as chamadas comunidades virtuais. Estes espaços parecem ganhar a preferência dos internautas seja para bater um mero papo informal, ou até mesmo para desenvolver pesquisas de ponta. Mas qual seria o motivo para essa coqueluche?

Uma das respostas seria por causa da velocidade de comunicação e pelo apelo ilustrativo proporcionado pelas mídias envolvidas nesses ambientes. Outra resposta poderia se pautar no fato da praticidade de se comunicar com várias pessoas em diversos lugares, que fizeram, ou fazem, parte de nossas vidas, sem precisar sair de casa. Ou quem sabe pelo simples modismo de se participar de uma comunidade virtual.

Acredito que o grande pretexto para quem participa das comunidades virtuais é o simples fato da possibilidade de atualização de realidades latentes, que encontram materialidade, nem que sejam por pouco tempo. A necessidade de relacionamento social é uma característica intrínseca aos seres humanos e a, otimização ou manipulação dos laços afetivos é um atrativo natural para qualquer membro de nossa raça.

Viver em comunidade não é nenhuma novidade. O encanto está em levar essa vivência às ultimas conseqüências, em ma espaço de possibilidades não-linear, de tal forma que os caminhos e as relações sociais se atualizam a todo o momento. Mudar de identidade passou a ser algo trivial, onde o perfil híbrido e histórico é o que difere cada membro participante.

Nessa perspectiva de opções, as idéias de cooperação e colaboração despontam como eixos de trabalhos, que orientam as redes produtivas sejam para um simples fórum de debates ou até mesmo para a construção de softwares em código aberto.

A existência de redes informais de colaboração no interior das organizações e entre as organizações já é um fenômeno social já estabelecido. Elas coexistem em paralelo as estruturas formais das organizações gerando seus próprios padrões e normas de interação. Estas redes informais tem sido alvo de vários estudos na pesquisa social (HOMANS, 1950. GROSS, 1953. BLAU&SCOTT, 1962. apud KIMIECK,2002).

Wenger, (1998) que define essas redes informais de colaboração como comunidade de prática formadas por pessoas engajadas em um processo de aprendizagem coletiva em um domínio compartilhado, tais como: um grupo de engenheiros trabalhando em problemas similares, um grupo de alunos/professores definindo suas identidades na escola, uma rede de cirurgiões explorando novas técnicas.

Assim, comunidades de prática são grupos de pessoas que compartilham uma preocupação, um objetivo ou uma paixão por alguma ação que fazem e aprendem, através de uma interação constante com os membros dessa comunidade, como fazer essa ação cada vez mais aprimorada. Essa definição propõe, mas não assume, intencionalmente, que a aprendizagem pode ser a razão principal para uma comunidade começar, ou ainda a aprendizagem pode ser o resultado incidental da interação entre os membros da comunidade. Nem tudo o que é chamado de uma comunidade é uma comunidade de prática. Para o autor, três características são cruciais para uma comunidade ser uma comunidade de prática: o domínio, a comunidade e a prática. Essas características são apresentadas pelo autor, da seguinte forma:

O domínio: A comunidade de prática possui uma identidade definida por um domínio compartilhado de interesses, assuntos, temáticas ou conhecimentos. Os membros impõem um comprometimento ao domínio escolhido e, uma competência compartilhada que os distingue de outras pessoas. Os membros de uma comunidade de prática valorizam suas competências coletivas e aprendem uns com os outros, mesmo que poucas pessoas fora do grupo valorizem ou mesmo reconheçam essa especialidade.

A comunidade: Os membros da comunidade se envolvem em atividades conjuntas e discussões, procurando interesses comuns em seus domínios, ajudam uns aos outros, compartilham informações e constroem relacionamentos que propiciam uma aprendizagem compartilhada.

A prática: Uma comunidade de prática não é meramente uma comunidade de interesses. Membros de uma comunidade de prática são praticantes, isto é, desenvolvem um repertório de pesquisas compartilhadas, tais como: experiências, histórias, ferramentas, formas de lidar com problemas recorrentes. Esse processo leva tempo, sustenta e mantém a interação do grupo.

Segundo o autor, em comunidades de práticas, a negociação de significados é um processo complexo que leva tempo, pois o que define a comunidade de prática em uma dimensão temporal é a questão do compromisso e engajamento mútuo, a fim de que todos os membros compartilharem uma aprendizagem compartilhada e significativa.

A partir desta perspectiva, o referido autor afirma que as comunidades de prática podem ser pensadas como histórias de aprendizagem compartilhada. Nesse sentido, “história” não é uma questão meramente pessoal ou uma experiência coletiva, mas uma combinação de participação e reificação, dois modos de existência ao longo do tempo, que interagem mesmo localizados em dimensões diferentes. Para o autor, nossa experiência, nossa prática, está em constante movimento, sempre interagindo com outras práticas e experiências, sem se fundir a elas.

A participação representa a ação de tomar parte em alguma coisa, assim é na relação com outras pessoas, nas comunidades de prática, que esse processo se torna evidente. A participação é tanto pessoal quanto social e é concebida como um processo completo que combina as ações de fazer, falar, pensar, sentir e pertencer.

A reificação, por sua vez, é entendida como a conversão de algo em coisa, esse algo pode ser compreendido como idéia, faculdade, pensamento, etc., ou seja, é uma maneira geral para se referir ao processo de dar forma à experiência, produzindo objetos que moldam essa experiência em uma coisa concreta. Assim, esse termo abraça e amplia uma gama de processos que incluem fazer, desenhar, representar, nomear, codificar, descrever, perceber, interpretar, utilizar, reutilizar, decifrar e reestruturar. Logo, em todos esses casos, esses processos se solidificam em formas concretas de aspectos da experiência e da prática humana e, é isso que lhes dá a condição de objeto.

Com essas perspectivas, estamos conectados à nossas histórias por meio da forma como os artefatos são produzidos, preservados, resistidos ao tempo, reapropriados e modificados através dos anos, e também através de nossa experiência e participação, assim como nossas identidades são formadas, herdadas, rejeitadas, bloqueadas e transformadas pelo engajamento na prática de geração para geração. Wenger (1998) observa que as experiências adquiridas continuamente estão intimamente ligadas às práticas.

Nesse sentido, a aprendizagem não se processa em um contexto no qual simplesmente as pessoas devem aprender alguma coisa, mas sim estarem engajadas na prática. Assim, faz parte da aprendizagem este processo de engajamento, participação e desenvolvimento da prática. Neste contexto,

“[...] práticas são histórias de engajamento, negociação e desenvolvimento de repertórios compartilhados, então, aprendizagem na prática inclui seguir o processo da comunidade envolvida. Mas, é preciso tomar cuidado para não dizer que qualquer coisa que se faça é aprendizagem. A aprendizagem significativa abrange dimensões da prática como: envolvimento e formas mútuas de engajamento; entendimento; desenvolvimento de repertórios compartilhados, estilos e discursos. Isso é o que modifica nossa habilidade de engajamento na prática, de entendimento sobre o porquê fazemos parte dessa prática. Esse tipo de aprendizagem não é meramente um processo mental, mas tem a ver com o desenvolvimento de nossas práticas e de nossa habilidade para a negociação de significados. Assim, criamos maneiras de participação na prática no processo de contribuição para fazer dessa prática o que ela é”. (Wenger, 1998 p.94)

Assim, para o referido autor, prática é o compartilhamento de histórias de aprendizagem que requer uma compreensão para que ocorra engajamento. É um processo social e interativo, no qual as pessoas trocam, fazem coisas juntas, negociam novos significados e aprendem uns com os outros. Sendo assim viver em comunidade passa a ser um processo natural de aprendizagem.

KIMIECK, J. L. Consolidação de Comunidades de Pratica: Um estudo de caso no Proinfo. Curitiba, 2002. Dissertação de Mestrado – Programa de Pós-Graduação em Tecnologia, Centro Federal de Educação Tecnológica, Curitiba, 2002.

WENGER, E. (1998). Communities of practice: Learning, meaning, and identity. New York: Cambridge University Press.